sábado, 27 de março de 2010

mudança

Depois de quase 2 anos a usar a plataforma blogger, decidi tentar a mudança de ares.
Assim, criei o "novo" lanchonete em:
lanchonete.wordpress.com
Espero que gostem, espero que comentem.

Pedro Rui
Senhora da Hora, 27 de Março de 2010

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Desencanto

Votei ontem. Desencantado.
Desencantado porque, mais do que decepção pela campanha vazia, mais do que apreensão pela reveladora abstenção, mais do que revolta pelo oportunismo reinante, senti angústia por ser este o acto maior de um sistema que se quer único, eterno e incontestável.
Que no seu fundamentalismo anacrónico despreza quem imagina qualquer outra forma de organização.
Que ostraciza quem ousa imaginar outro caminho.
Que na sua intolerância escondida marginaliza quem não subscreve incondicionalmente o pensamento dominante.
Que sonha impor à escala planetária a sua suposta superioridade moral.
E é pobre, um sistema assim.
Que se esgota em actos pontuais.
Que se fecha sobre si mesmo num corporativismo a lembrar outros tempos.
Que assenta numa elite dirigente, acéfala e ausente.
Uma elite cujo principal objectivo é perpetuar-se, eternizando o seu poder, legitimando os seus privilégios.
Uma elite constituída por partidos cujas diferenças se limitam ao discurso formal e aos símbolos identificativos, que se protegem mutuamente, certos de que a alternância fará o seu papel.
Que se julga imbuída de uma missão sagrada, acima de tudo e todos.
Que admite apenas que a intervenção popular, bárbara e desinformada, por definição, seja balizada e delimitada no tempo.
Daí o esforço em fazer das eleições uma festa apoteótica, um orgasmo.
Que sacie o apetite de intervenção dos cidadãos. Que faça crer que uma cruz num quadrado tem um poder ilimitado e definitivo.
Mas não tem. É um acto vazio.
Ritual de legitimação de uma democracia parlamentar esgotada, anacrónica e pobre.
Porque anacrónico é um sistema que se eterniza no tempo.
Pobre é um sistema que se limita.
Desencantado votei ontem…

Pedro

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Rhodes




Confesso que não sou viajante organizado
Não investigo de antemão os locais que visito.
Não planeio, não preparo ao pormenor as viagens que faço.
Rumar a uma qualquer cidade com o mínimo de balizamento constitui para mim um atractivo adicional.
Que confere à viagem um necessário grau de incerteza.
E que deixa terreno fértil para a surpresa.
Rhodes não foi excepção.
As referências que levava resumiam-se ao mítico colosso, e ao acordar de Corto Maltese, na cúpula de uma qualquer mesquita, ao iniciar a sua aventura rumo a Samarcanda, em busca de mais um tesouro, em busca de Rasputine.
Foi assim, com estas fantasiosas referências, que cheguei às margens do Egeu.
Fantasia que rapidamente se transformou em surpresa.
Surpreendente, Rhodes revelou ser uma cidade fascinante, uma cidade única.
Fascinante porque soube aproveitar a sua posição geográfica, o seu interesse estratégico, para se tornar única.
Por ali passaram Gregos, Romanos, Bizantinos, Genoveses, Venezianos, Sarracenos...Não foi por acaso que, vinda do Chipre, a Ordem Hospitalar de São João de Jerusalém ocupou a ilha em 1309, servindo-se dela como posto avançado no apoio aos cruzados rumo à Terra Santa.
Dessa presença chega-nos a impressionante fortificação da cidade e os notáveis Albergues.
É única a sensação de percorrer a Rua dos Cavaleiros, descobrindo os escudos dos diversos reinos Europeus.
É emocionante depararmo-nos com as Quinas cravadas na parede do Albergue de Espanha.
E é esmagador chegar ao Palácio do Grão-Mestre no topo desta Rua. Impressionante e dominador.
Palácio que, apesar da reconstrução de gosto e critério duvidoso levada a cabo pelos Italianos já no Sec.XX, mantém a sua aura de imponência incontestável, de autoridade divina.
Não será difícil de imaginar a afronta e inveja que a impressionante silhueta da cidade murada, uma das maiores da Europa, despertou na Turquia, do outro lado do estreito.
Afronta que perdurou por pouco mais de 200 anos, até que em 1522 os Turcos Otomanos, liderados por Suleiman o Magnífico, expulsaram os Cavaleiros de São João, que se viriam a estabelecer na ilha de Malta em 1530.
Com Suleiman, conhecido por ter propiciado grande desenvolvimento cultural e artístico do Império Otomano, chegam à cidade as inevitáveis Mesquitas com os elegantes Minaretes.Destaco a que lhe é dedicada, pela sua posição de domínio sobre a cidade, desafiando a autoridade simbólca do Palácio do Grão-Mestre.
Mas foi com surpresa e fascínio que descobri a pequena Mesquita, mas sobretudo o cemitério Turco de Murat Reis, já fora dos muros da cidade.
O actual estado de abandono, a que não será alheia a animosidade reinante entre Grécia e Turquia, por causa do diferendo Cipriota, contribui para adensar o ar misterioso, amaldiçoado do local.
Que, confesso, se tornou um dos meus locais favoritos...
Foi longa de 400 anos a presença Turca, terminando em 1912, com a conquista da cidade pelos Italianos.Começa aqui uma obsessão de 30 anos, responsável por grande parte das reconstruções que permitiram que a monumentalidade da cidade chegasse até aos dias de hoje.
Obsessão que fez do Palácio do Grão-Mestre residência de Verão para Mussolini e Victor Emanuel III.
Obsessão na reconstrução dos Albergues da Rua dos Cavaleiros.
Obsessão de quem supunha que a presença Italiana duraria certamente mais...
Finalmente, e após a II Guerra, Rhodes é integrada na República Grega, estatuto com que chega aos dias de hoje.
E chega com características únicas, com uma hospitaleira e descontraída população.
Fruto das múltiplas influências.
Fruto da necessidade de sobrevivência às variadas mudanças na ilha.
Mas fruto, também, de uma abertura natural ao exterior.
E foi essa abertura que a tornou, mais do que uma cidade Grega, mais do que uma cidade Turca, uma cidade universal.
Uma cidade do mundo.
Pedro Rui

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Sepúlveda

Tudo começou há cerca de um ano atrás.
E começou no Caramulo quando, por uma série de coincidências, "o velho que lia romandes de amor", foi para às mãos da Ana.
Seguiu então o seu rumo lógico, para a minha mesa de cabeceira.
Li-o depois, sem reconhecer nele o manifesto ecologista que anunciam aos sete ventos.
Encontrei, sobretudo, histórias de vida.
Histórias exemplares, cujas palavras de Sepúlveda libertaram da imensa clausura da selva.
Um pouco à semelhança dos romances de amor que o velho dentista levava para El Idilio.
Li depois o desencantado "o nome do toureiro" e o inconstante "encontro de amor num país em guerra".
Sobre o autor, confesso, não sabia mais do que as breves biografias de ocasião, impressas nas contracapas dos livros que li.
Mas a vida oferece-nos surpresas inauditas.
Ao escolher alguns livros para levar para férias furtei à mesa de cabeceira do meu pai "o General e o Juíz".
Abri-o pela primeira vez no avião a caminho da universal Rhodes.
E o que li emocionou-me de tal forma que não o voltei a abrir em público.
O sangrento e traiçoeiro golpe chileno de 73, descrito com crueza e objectividade acutilante.
As vidas sofridas, descritas com doces palavras por quem as viveu de perto.
A falta de diplomacia com que a vergonha da omissão chilena é narrada.
A prisão de Pinochet em Inglaterra, descrita com incontida alegria, com esperança na justiça.
A falta de decoro com que as instituições chilenas assumiram a defesa do carrasco que as espezinhou anos sem conta.
A desilusão e frustração pelo vergonhoso desfecho, pela chegada triunfante do senador vitalício ao seu Chile
Tudo isso, reunido em escassas páginas, num tempo em que tudo o que temos é informação acéfala, alinhada, escrava do politicamente correcto, devota do esquecimento, devolveu-me a certeza de que vale a pena tomar partido.
De que vale a pena assumir posições. Por muito desalinhadas que pareçam.
Não podia, pois, deixar escapar a oportunidade de conhecer pessoalmente Luis Sepúlveda, assistindo à apresentação do seu novo livro.
E conheci um homem que, apesar das agruras que passou, do exílio que sofreu, dos amigos que viu desaparecer, da omissão a que foi votado, mostra ainda um brilho nos olhos quando fala dos 2 minutos de filme que conseguiu resgatar de um cinema abandonado em Porvenir na Patagónia.
Que tomou orgulhosamente parte de uma bonita aventura que terminou mal, às mãos de uma vergonhosa corja de dementes.
Que privou com Allende, de quem fala com uma contagiante alegria, com uma infantil admiração.
Foi com emoção que o ouvi contar, desolado, que não conseguiu chegar a La Moneda nesse obscuro 11 de Setembro em que El Presidente pos fim à sua vida.
Mas foi sobretudo uma grande honra o que senti quando lhe apertei a mão, a esse homem que um dia será sepultado junto com os seus camaradas da escolta pessoal de Allende, junto a ele.

Pedro Rui







quarta-feira, 24 de setembro de 2008

a verdade é uma só


A verdade é uma só
O lobo é mesmo lobo
Mesmo vestido de avó

(Trovante)

Dias conturbados, estes.
Dias de tempestade.
Algo vai mal no coração do império.
Falo, claro, dos recentes desenvolvimentos da crise do sistema financeiro norte-americano.
É um tema que não me seduz particularmente.
Que não abordaria, não fosse o carácter excepcional da recente operação de resgate da AIG.
Que não altera em nada a minha antiga convicção de que caminhamos para uma crise.
A minha convicção de que o sistema capitalista caminha a passos largos para uma crise sem precedentes.
Sabia-o antes. Não precisei de mal explicadas falências, nem de atabalhoados resgates para o confirmar.
É inevitável, e é inerente ao próprio sistema.
Por muitos floreados que se inventem, o capitalismo visa apenas a maximização do lucro.
Não procura equilíbrios. Vive precisamente do desequilíbrio. Da exploração.
Aplicando esta lógica a um sistema de recursos limitados, a consequência inevitável será a exaustão, o desastre.
Não existe, nem pode existir capitalismo de rosto humano.
Não existe, nem pode existir, controlo eficaz sobre um sistema desta natureza.
É contra-natura.
É na sua essência um sistema autofágico. que se consumirá, inevitavelmente.
Quando?
Dependerá essencialmente da capacidade adaptação que demonstrar face a situações de crise, mais ou menos previstas.
Não é de hoje, a adopção pelo sistema capitalista de medidas tipicamente socialistas, como forma de acalmar tensões sociais e de ultrapassar crises.
Já o vimos antes. Durante todo o Século XX foi assim.
Surpreendeu-me, no entanto, ver a conservadora administração Norte-Americana lançar mão de uma das mais odiadas ferramentas socialistas: A Nacionalização.
Esse pecado capital, essa abominação de natureza, esse atentado contra a propriedade privada, supremo e inalienável direito capitalista.
Durante dias a imprensa chamou-lhe operação de salvamento, injecção de capital, e outros eufemismos.
Compreende-se.
Nacionalização é típica do louco Chavez. Não de Bush.
Mas, por muitas voltas que tentemos dar, quando o estado injecta dinheiro numa empresa, recebendo em troca 80% desta, do que se trata é de uma nacionalização.
E, este recurso desesperado a tão drástica medida, revela com clareza cristalina a profundidade da crise instalada.
Será ultrapassada? Creio que sim.
Com sacrifícios para os suspeitos do costume, mas sim, será ultrapassada.
Esta e as seguintes, que virão.
Resta saber quantas mais…


Pedro Rui



domingo, 21 de setembro de 2008

Há dias assim...

Há dias assim. Reveladores.
Claros como a água.
Em que se revela, numa só frase, o que esteve escondido durante anos.
E há frases traiçoeiras.
Frases que encerram em si mais do que dizem.
Quando o Ministro da Economia manifestou o seu desejo de que o preço dos combustíveis descesse rapidamente, quis dizer mais do que na realidade podia.
Quis pressionar o mercado, essa entidade sacrossanta, esse regulador das relações capitalistas.
Mas, como seria de esperar, o "mercado" não se comoveu com tão sincero como despropositado apelo.
E respondeu, na voz de um presidente de uma qualquer obscura associação do sector, com uma agressiva e quase humilhante declaração, compreendendo carinhosamente os desejos do Cidadão Manuel Pinho, mas classificando de icompetente e ignorante o Ministro Manuel Pinho.
Foi uma cabal demonstração da correlação de poder que vigora hoje, tempo de globalização em que o liberalismo é apresentado como a única solução viável. Viável para quem, é questão para outra conversa.
E tais declarações só podem ser surpresa para quem andou alheado da vida pública Portuguesa nos últimos 20 anos.
Esses 20 anos em que governos sucessivos, uns rosa outros laranja, mas todos cinzentos, adoptaram o lema
"menos estado, melhor estado".
Em que, em nome da redução do deficit, se entregaram ao sector privado, tudo que era lucrativo no sector público. GALP incluída. Em troca de receitas extraordinárias que nos permitiram a efémera glória de cumprir os critérios de convergência da União Europeia.
Em que se satisfez a voracidade de novos e velhos capitalistas.
Com que moral querem agora que o sector privado abdique dos lucros, que são o seu objectivo último?
Nisso dou razão ao representante do Cartel. Nas petrolíferas mandam os accionistas.
Por muito que o público anseie pela baixa de preços, ela só ocorrerá quando estas assim o entenderem.
Não quando Manuel Pinho, Cidadão ou Ministro, o deseje.

Mas, este infeliz bate-boca, trouxe à memória mais um revelador episódio.
Revelador do despudor com que, em nome do bem do consumidor, se deu uma fatal machadada na única ferramenta que poderia poupar a Manuel Pinho o ralhete que ouviu. E aos Portugueses uns bons milhares de Euros.
Falo, claro, na abolição do preço máximo de venda dos combustíveis pelo Governo.
Refiro-me à pseudo-liberalização do mercado das gasolinas, anunciada por Durão Barroso como um grande passo para os consumidores, os grandes beneficiados com este estímulo à concorrência.
Disse pseudo-liberalização porque na realidade, o mercado já era suficientemente liberalizado, sendo o preço livre, mas com um tecto máximo definido pelo Governo.
Confesso que nunca entendi como é que o facto de haver um preço máximo podia inibir a concorrência...
O resultado está à vista. E vê-se no bolso de todos.
Era óbvio então, como é óbvio hoje que o mercado não funciona, em sectores essenciais em que o grande parte do consumo é uma necessidade e não uma escolha.
Ainda por cima quando os intervenientes são poucos.
Que não precisam sequer de se cartelizar para funcionar como um bloco.
Era óbvio então, como é óbvio hoje que é imperativo que exista nas mãos do estado uma ferramente forte de regulação. A definição do preço máximo parece-me a mais lógica.
Durão Barroso aboliu-o, e não me lembro de vozes discordantes, nem nos cinzentões do PS, nem na imprensa, subserviente e alinhada com os interesses dominantes.
Ouço hoje vozes revoltadas mas pouco esclarecidas. Vozes dos que calaram na altura.
E que se calarão mais uma vez, quando as gasolineiras baixarem 1 ou 2 cêntimos no preço.
Comprando uma vez mais o direito de se preocuparem somente com o seu lucro.

Pedro Rui